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Vocês que acompanham o Gagá Games sabem que eu acabei de passar por uma maratona para zerar Tales of Phantasia, de Super NES. Agora que terminei o jogo, consumindo dois meses preciosos de minha vida idosa, me sinto preparado para dar minha opinião sobre ele. Vamos lá?

Um pouco de história

top-box“Tales of Phantasia” é obra da hoje defunta Wolfteam, uma desenvolvedora de games que também foi responsável por pérolas como Arcus Odyssey, El Viento e (um dos favoritos da casa) Valis.

A Wolfteam precisava encontrar uma produtora para seu RPG “Tale Phantasia”. Namco e Enix deram seus lances, e a Namco acabou ganhando. Entretanto, a Namco exigiu que fossem realizadas diversas alterações no jogo — a começar pelo título, que passou a ser “Tales of Phantasia”, passando por diversos elementos da trama, como a remoção de boa parte da história original de Dhaos. Isso causou bastante confusão e atrasou o desenvolvimento do jogo em pelo menos um ano, deixando vários membros da equipe bastante insatisfeitos.

Dentre eles estavam Yoshiharu Gotanda (total programmer), Masaki Norimoto (game designer) e Joe Asanuma, que deveria ser o diretor do jogo, mas acabou substituído por Eiji Kikuchi, o que muito provavelmente deixou o cara louco. Após o lançamento do jogo, os três deixaram a equipe e formaram a Tri-Ace (responsável por maravilhas como Star Ocean, Valkirye Profile e outros).

O jogo não chegou a ser lançado em inglês para o Super NES. O problema foi resolvido pelo grupo de rom hacking DeJap, que traduziu o jogo todo. Só muitos anos depois o ocidente veria Tales ser lançado oficialmente em inglês, nos remakes para GameBoy Advance e Playstation. O script foi suavizado em relação à tradução da DeJap, que contém alguns trechos impróprios para menores, com referêcnias sexuais explícitas e linguajar pesado. Acredito que a tradução da DeJap esteja mais próxima ao script original, mas como não sei japonês… convém lembrar que também há uma versão em português, baseada no script da DeJap.

Os gráficos de TOP são caprichados
Os gráficos de TOP são caprichados

TOP começa mostrando a batalha de um grupo de heróis contra o maligno Dhaos. Após a aparente derrota de Dhaos, a ação muda para a vila de Totus, lar de Cless, mocinho do jogo. A vila é atacada e seus habitantes, incluindo os pais de Cless, são mortos. Esse evento dá início a jornada de Cless por vingança que, como em toda bom RPG, acaba revelando uma trama bem mais complexa do que o herói esperava — vamos falar sobre isso mais adiante.

O sistema de jogo

Um dos trunfos de TOP é que ele traz um sistema de jogo bastante interessante e bem elaborado. Os personagens se dividem nas quatro categorias básicas dos RPGs: guerreiro, curandeiro, invocador (summoner) e feiticeiro. Muitos jogos trazem essas classes de personagens, mas em Tales o papel de cada classe é bem mais marcado que em outros RPGs. Em suma, o único personagem que realmente vai partir para o “mano-a-mano” é Cless, o guerreiro. Mint, a curandeira, dificilmente vai acertar uma bordoada em alguém, limitando-se a ficar lá atrás, usando suas magias de cura e auxílio. Klarth, o invocador, e Arche, a feiticeira, vão usar e abusar das magias. Isso não costuma funcionar muito bem em outros RPGs, porque o grupo geralmente é posto todo em uma mesma “frente” de combate, o que faz com que seus frágeis curandeiros muitas vezes sejam atingidos por seus adversários. Em Tales, porém, a disposição do grupo (que é personalizável) malandramente coloca os magos mais para trás por padrão, e a não ser que você seja surpreendido por um inimigo, na maioria das vezes Cless vai ser uma espécie de escudo para a “cozinha da magia”.

Fora isso, a cada batalha vencida uma pequena quantidade de TP (pontos de técnica) é restaurada, e há uma abundância de itens para a recuperação deles, além de equipamentos que recuperam TP durante as batalhas. Isso estimula o uso pesado de magias, de modo que você não se verá “economizando” seus magos para guardar magia para os chefes. Sendo assim, a “cozinha” em Tales é tão ou mais útil que Cless, mesmo nos combates rotineiros.

O combate em Tales é bem dinâmico e muito divertido
O combate em Tales é bem dinâmico e muito divertido

O combate corpo-a-corpo também não fica atrás: Cless conta com seu próprio arsenal de técnicas com a espada. Conforme você faz uso delas, Cless vai aprendendo técnicas novas, o que mais uma vez estimula o uso das mesmas. Nota-se a preocupação dos desenvolvedores em estimular o uso das técnicas especiais de cada personagem, o que contribui para que o jogador valorize suas características individuais. Gol de placa da equipe de desenvolvimento.

Como se isso já não bastasse, os combates são bem dinâmicos. Cless é o único personagem cujo movimento você controla. Suas técnicas são realizadas por combinações simples de botões, e a técnica utilizada varia de acordo com a distância entre o personagem e os adversários. Os outros personagens movimentam-se por conta própria, mas você pode ordenar que invoquem as magias que desejar. Dentro ou fora da batalha você também pode definir a postura de cada personagem, ordenando a Klarth, por exemplo, que invoque a maior quantidade de elementais possíveis, e a Mint que priorize a cura dos personagens. O sistema de combate como um todo funciona muito bem, e é uma pena que mais jogos não tenham aproveitado as boas idéias de Tales.

top-mintOutro ponto de destaque são os itens. A quantidade de itens em Tales é enorme — na verdade, enorme demais para o meu gosto, e eu terminei o jogo sem parar para ver o que muitos deles faziam, porque são muitos mesmo. Acrescente a isso o fato de que alguns itens podem ser transformados em outros com o auxílio de um item especial, o que dobra a complexidade da coisa toda. Os japoneses são doidos por esse tipo de coisa, mas eu acho um pouco complicado demais. A tendência se repetiria num futuro jogo da Tri-Ace, Star Ocean 2, com uma quantidade ainda mais bizarra de itens. Mas eu provavelmente estou sendo injusto: tendo um emulador com centenas de jogos, é fácil reclamar da complexidade do sistema de itens. Porém, se eu estivesse jogando em um Super NES de verdade, e só pudesse comprar uma meia dúzia de jogos, isso provavelmente seria uma benção, pois eu jogaria tudo de novo para dominar o inventário e descobrir todos os itens possíveis.

Aliás, Tales oferece uma bela quantidade de extras. Devido à minha falta de tempo eu tive que passar direto por várias side-quests, mas percebe-se que há muito a ser feito no jogo, em particular na segunda metade. Sem falar no truque que habilita o modo hard, que deve dar um novo fôlego ao jogo. Para habilitar o modo hard, basta apertar A + B + X + Y na tela de abertura.

Músicas de primeira

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Toca mais uma aí, parceiro!

As músicas de Tales são um verdadeiro desbunde, o que não é uma grande surpresa para quem conhece o nome Motoi Sakuraba. Motoi é um conceituado compositor de trilhas. São obras suas as trilhas dos já mencionados Arcus Odissey e El Viento, além de Star Ocean, Baten Kaitos, Valkyrie Profile e de toda a série Tales. Vale destacar o tema de abertura que é cantado, uma raridade na era dos 16 bits.

As músicas se encaixam muito bem com os diversos eventos do jogo, e coroam a experiência. São a cereja do bolo. O próprio Motoi faz uma pontinha no jogo, tocando em um bar na cidade de Alvanista.

Considerações sobre a trama (CONTÉM SPOILERS!)

Outro trunfo de Tales são seus personagens. Os quatro personagens principais são muito carismáticos, e na primeira metade do jogo são muito bem desenvolvidos. Há diálogos marcantes e engraçados, que fazem com que você realmente se importe com os personagens. Logo você notará que Cless é um enfezado, Mint é uma menina sensível, Klarth é um doidão e Arche é uma… bom, digamos que ela é um tanto precoce para uma menina da sua idade.

top-clessInfelizmente, na segunda metade do jogo o desenvolvimento das personalidades diminui a marcha sensivelmente. Há menos diálogos, e menos surpresas ou aprofundamentos quanto a história de cada um, com poucas exceções. Bem perto do final há um evento interessante com Mint, mas de modo geral, após o evento do canhão Mystek em Midgard, nota-se uma queda no ritmo. Há uma tentativa fracassada de inserir Chester no grupo, mas o jogador não vê bons motivos para trocar algum membro do grupo por ele, e ele acaba ficando no banco por boa parte do tempo. Dado o histórico do jogo, podem ter havido problemas na produção que afetaram um pouco o ritmo. O fato é que a primeira metade do jogo, de um modo geral, parece mais interessante que a segunda.

É curioso notar que até os elementais invocados por Klarth têm personalidade. Embora o jogo só dê leves pinceladas nesse aspecto, não só há um diálogo com os elementais quando os mesmos são encontrados como alguns participam ativamente de alguns momentos do jogo, como na ida à cidade submersa de Tor e no evento em que Origin exibe uma cena do passado de Klarth. Seria interessante ver a idéia ainda mais desenvolvida em outros RPGs.

A trama tem ótimas idéias. O final é bastante interessante, invertendo os papéis e mostrando que a sede de vingança do “herói” Cless apenas contribuiu para a destruição de outra civilização inocente. Não que Cless tivesse alguma escolha, era o mundo dele ou o de Dhaos, mas é bastante reprovável a postura de Cless diante do “vilão”. Mais correto seria dizer que não há heróis em Tales, apenas uma luta desesperada pela sobrevivência entre duas civilizações. Fascinante a idéia. Minha única crítica é quanto ao final, em que os desenvolvedores deram uma aliviada na coisa toda, fazendo com que Martel salvasse o mundo de Dhaos, arruinando o drama. Fica a impressão de que o final do jogo foi “remendado” para aliviar o clima. Melhor seria ter tido a coragem de encerrar Tales of Phantasia com um toque de melancolia à la Phantasy Star II. É como dizem, calça de veludo ou c* de fora.

Conclusão

Tales of Phantasia é um baita RPG, oferecendo uma boa trama, bons personagens e um excelente sistema de jogo. Incrível como não teve uma influência maior sobre outros jogos do estilo. O Gagá recomenda Tales a todos os amantes de RPG, em particular àqueles que têm tempo de fuçar todas as side-quests do jogo.

Links úteis

O Gagá viu e review: Tales of Phantasia
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