“Para quem quer fazer exercícios de reflexão”
Olá crianças!
Estes dias estava redigindo um artigo para apresentar em um congresso que (se tudo der certo) vou participar em Goiânia e achei que seria legal compartilhar um pouco dele com vocês. Não vou entrar em toda a argumentação porque não caberia aqui, mas compartilharei o suficiente para discutirmos (que é o que mais importa para ser sincero).
Quando pensamos em “técnica” a primeira coisa que nos vêm à cabeça é, geralmente, a aplicação prática de determinada ciência. Ou, se conseguirem enxergar “tecnologia” como um sinônimo, podem pensar em maquinários (tanto da era industrial como computadores). Porém, na antiga Grécia, a técnica não significa isso.
Máquinário de uma indústria têxtil.
Para os gregos, “técnica” era um modo de conhecimento. Tinha lá suas particularidades, mas não era “aplicada” puramente. Ela consistia no saber do artesão que produzia coisas. E mesmo “produzir” tinha um sentido especial para aquele povo que ainda hoje influencia nossa relação com o mundo; não era “fabricar” simplesmente, mas um tipo de “tornar presente a outras pessoas algo que lhes está ausente”. Ou seja, com base em uma ideia (“imagem diretriz”), o artesão utiliza seu saber técnico para produzir algo para ser usado por outras pessoas. De modo que é sempre a forma e a aparência do objeto que se quer produzir que delimita todo o procedimento técnico (e não o contrário).
Vale lembrar que, na língua latina, a palavra que traduzia “tekhne” do grego era “ars” que acabou originando a palavra “arte” em português. Ou seja, quando falamos de “arte” e “técnica” devemos (ou deveríamos) falar da mesma coisa, do mesmo fenômeno. Mas essa relação eu exploro melhor em outro post.
Parthenon.
Gadamer comenta que os gregos já tentavam aplicar esse tipo de saber para explicar ou descrever o saber ético humano. O que acabou se mostrando um erro já que não nos dispomos a nós mesmos como um artesão faz com a argila. Hoje, com a massificação da técnica, ela acabou sendo mais importante que o objeto a ser produzido e, pior ainda, acabou se tornando referência para o agir humano de modo geral.
A pergunta que fica então é: como entender jogos nesta perspectiva? Pensamos, claro, em videogames logo de cara por serem “jogos tecnológicos”. Será que nos tornamos “seres técnicos” quando jogamos um game?
Conforme fui analisando este problema, notei que a questão da técnica se aplica a todo jogo. Afinal, ele sempre parte de uma ideia diretriz e é “produzido” com a matéria-prima disponível. E o aprendizado deste saber técnico pode ser tanto pela experiência direta (alguém que brinca com galhos, por exemplo), como por meio da aprendizagem mais formal (alguém que aprende marcenaria e monta seu próprio carrinho, por exemplo). O mesmo, claro, se aplica à produção de games.
Um artesão trabalhando. Ou acham que só o game designer que faz o jogo? Mas o que seria do arquiteto sem os pedreiros? 🙂
E também pode acontecer de termos que utilizar conhecimento técnico dentro do jogo. Tanto é que muitos jogos e games têm a própria construção (e utilização de recursos disponíveis) como seu ponto central. Embora, é claro, isso não seja regra: nem todo jogo requer isso de nós.
Portanto, acabei percebendo que quando jogamos qualquer coisa, não nos submetemos à técnica que o produziu, ou às mãos do artesão que o moldaram, mas ao jogo mesmo. Se o artesão não pode garantir que o uso do objeto que construiu será exatamente como imaginou, o mesmo pode acontecer aqui: mesmo que queiram, ao jogarmos um jogo, não aplicamos necessariamente o saber técnico a nós mesmos e às nossas ações em jogo. Em jogo, o conhecimento que está mais envolvido é sempre o ético por ser essencialmente um agir.
Este, e todo jogo, envolve produção e, portanto, é originado graças ao saber técnico.
É isso que queria compartilhar com vocês hoje. Até o próximo post!
uma vez Mestre Senil, acabei conhecendo o Rpg Maker e fiquei fascinado quando eu mesmo poderia criar meu próprio rpg. e ao estilo de Phantasy Star! mas como eu era jovem na época, não tive muito saco para criar um game inteiro. mas eu fiz uma cidade,Dungeon e até mesmo um chefe. agora que tenho que trabalhar,não tenho mais tempo de me dedicar ao meu “Knight of Zerosthrasta”(o nome do joguinho que tinha criado)
leva muito tempo para um programador de games definir os gráficos de um cenário, qual música aquele lugar irá ter. então acho que sei um pouco os que os grandes criadores de games que nós amamos sente. queria ter tido mais dedicação com ele…mas quem sabe quando consertarem o meu PC(estou falando aqui pelo notebook) eu possa voltar a criar meu game. mesmo se demorar mais de um ano para isso
Hee-hoo para você Senil, ótimo Post!
leandro(leon belmont) alves[Citar este comentário] [Responder a este comentário]
excelente post ate hj não terminei meu jogo no rpg maker mas um dia espero terminar meu irmão esta fazendo um e eu vou terminar dai um joga a produção do outro vai ser bacana ^^
Tonshinden[Citar este comentário] [Responder a este comentário]
Gostaria que esclarecesse melhor suas ideias sobre “massificação de técnica e agir do ser humano”.
De qualquer forma, nenhum produto é determinado somente pelo seu criador. É o usuário, consumidor, espectador, quem de fato determina como o produto será aproveitado – afinal, nenhuma pessoa joga o mesmo jogo da mesma forma que outra pessoa.
Não sei se conhece, mas Scott McCloud em Reinventando os Quadrinhos aborda este assunto e também demonstra como esta diferença de perspectiva pode reinventar a forma como os quadrinhos são criados. Um de seus exemplos são suas filhas, que utilizam a “borracha” de um aplicativo de desenho (Kid Pix) não para apagar erros, mas para criar imagens únicas.
Versiani[Citar este comentário] [Responder a este comentário]
Bom texto Senil.
Ao meu ver, a pessoa que usa um determinado produto nunca se submeteu a técnica dele. Na época dos gregos, quem fabricava uma cela de cavalo não era necessáriamente um cavaleiro. E quem montava o cavalo não era um artesão.
Seguindo essa linha de raciocínio, posso afirmar que nem sempre um produto é utilizado como seu criador pensou. Muitos artefatos nem sequer utilidade tem para a grande maioria de nós. Por isso na hora que o objeto muda de mão, sua técnica desaparece. Posso muito bem pegar um copo de vidro que foi feito originalmente para beber água e usá-lo como vaso de planta.
Então, discordo com grande veemência da definição grega “tornar presente algo que está ausente”. Tudo que foi criado pelo homem do mais simples ao mais complexo surgiu da necessidade de se resolver um problema. E até você ter um problema, a solução dele não está “ausente”, pelo simples fato do problema não existir.
Falow!
piga[Citar este comentário] [Responder a este comentário]
que dias que é esse congresso em Goiânia cara?!
istemthebronx[Citar este comentário] [Responder a este comentário]
Olá pessoal! Desculpem de novo pela demora!… Muita correria esta semana também, para variar…
@leandro(leon belmont) alves
Cara u brinquei bastante com o RPG Maker uma época também! hehehe Tenho vários projetos começados e não terminados (e que talvez nunca termine). É algo que demanda muito tempo, esforço e, claro, técnica. Tem algumas coisas que a gente simplesmente tem que aprender na raça, ou com alguém ensinando a gente.
Conheço um pessoal que manja muito de RPG Maker. Se vocÊ sabe usar bem a ferramente, dá para fazer coisas tão diferentes que chega uma hora que nem parece mais que foi feito com o programa. hehehe
@Tonshinden
Vai fundo cara! Espero que seu irmão termine mesmo e que você também possa ter ânimo de completar o seu. Boa sorte na empreitada!
@Versiani
Opa! Com prazer!
Quando falo de “massificação da técnica” não me refiro, embora pareça, à produção em massa de produtos que chamamos de tecnológicos (eu acrescentaria “modernos” porque produtos mais antigos também dependem da técnica para existirem). Penso mais naquele perigo de aplicarmos a ideia da técnica a nós mesmos e ao nosso próprio agir cotidiano.
Gadamer (um dos autores que trabalhei) diz que muitos tentam defender a hipótese de que o homem coloca-se diante de si mesmo como a argila diante daquele que fabrica vasos. E para ele isso é um engano porque nosso agir ético (que é totalmente orientada a ação) não exige um conhecimento técnico. É quase como se, com isso, nos mecanizassemos e nos tornássemos um “produto da técnica”.
E o artesão/artista não tem mesmo como ter garantias de que seu produto será utilizado da maneira que planejou. Mas isso faz parte do processo mesmo. Eu mesmo, como escritor, costumo dizer que depois que eu termino um conto ou um texto qualquer, ele já não é mais meu, mas dos que o experimentam. Então isso nem é um “problema técnico”; se o cara que produz quer que sua obra seja aproveitada de um único jeito (que seria o “mais justo”), não faz a menor ideia do que seja produzir algo.
O exemplo que deu de usar uma ferramenta de outra forma passa por aqueles momentos de decisões técnicas do tipo “ah, queria fazer tal coisa, mas e se eu fizer com isto daqui ao invés daquilo?”. O técnico (ou artista, ou artesão) usa aquilo que está disponível, a matéria-prima que tem à mão. Não importa muito como ele use, desde que sirva para que torne presente a outras pessoas aquela ideia, ou imagem diretriz, que guiou todo o seu trabalho.
@piga
Valeu cara!
Quando penso em “se submeter à técnica” penso mais em duas coisas: naquela de você não olhar para aquilo que foi produzido e usá-la, mas ficar concentrado somente nos procedimentos do artista/artesão; ou naquela em que utilizamos o modo de conhecer técnico para aplicar em nosso próprio agir cotidiano, em nossa ética.
Com certeza, nem todo produto é usado como o seu autor deseja. Como falei num comentário acima, se um artesão fica nervoso por não ver sua obra utilizada da maneira que previu, ele não faz a menor ideia do que seja a produção técnica de algo. Embora não saibamos muitas vezes como algo foi feito (há muitas obras de séculos de idade que só especulamos o saber técnico que tinham e que utilizaram para erguê-las).
E, sobre a inutilidade, eu concordo totalmente. Obras de arte (no sentido de belas artes) e jogos de modo geral são inúteis mesmo: não têm uma finalidade pragmática.
Eu até concordo que algumas das coisas que produzimos são oriundas diretamente de um problema. Por exemplo, um artista que, enquanto pinta, quer usar uma cor nova para expressar “misericórdia” e começa a experimentar e provar algumas misturas até que chegue naquilo que imaginou. Agora, alguém que projeta uma catedral ou, puxando para o assunto-mor aqui do blog, um jogo de videogame não tem um “problema” no sentido estrito, mas uma “ideia” (ou “imagem diretriz”) que vai tentar alcançar com seu conhecimento técnico. Conhecimento esse que, de certa forma, vai esbarrar sempre em situações-problema (como o artista com a tinta nova que queria) já que fazer modificações e reduções é algo que sempre acontece na produção de qualquer coisa.
Interessante ter falado sobre essa questão da “resolução de problemas”, porque é algo que até tinha passado pela minha cabeça, mas havia me esquecido completamente. Assim eu consigo gravar na memória e tentar recuperar em um próximo artigo, quem sabe. Muito obrigado então! 🙂
@istemthebronx
Vai ser do dia 19 ao dia 21 de Setembro na Universidade Federal de Goiás. Mas eu nem sei se vou ainda; mandei o artigo e tenho que ver se será aprovado ou não. Você é da cidade?
O Senil[Citar este comentário] [Responder a este comentário]