“Para quem quer fazer exercícios de reflexão”

Olá crianças!

Engraçado como as coisas muitas vezes se encaixam na hora de esboçar uma postagem. Estou jogando Shining Force III há algum tempo e estava querendo falar alguma coisa sobre uma das nações deles chamada Aspinia sobre a qual falarei melhor depois. Esta semana comemoramos no Brasil nossa proclamação da República e, quando entrei no Google para revisar algumas informações etimológicas desse artigo, deparei-me com o aniversário de Auguste Rodin que esculpiu o famoso “o pensador”.

E tudo isso se inter-relaciona já que minha ideia para o post era justamente propor uma reflexão sobre a ideia de “república” que pode ser apresentada em um game, os sentidos originais da palavra e a meditação oriunda desse encontro próximo com o “conceito vivo” quando estamos imersos em um game.

Confuso? Espero que não fique nos parágrafos a seguir, porque creio que seja algo interessante para pensarmos juntos. 

Shining Force III para Sega Saturn é um jogo bastante instigante: dividido em três cenários, controlamos diferentes personagens que se esbarram mutuamente diversas vezes. No primeiro (e único lançado oficialmente em inglês), controlamos o exército de Synbios, lorde republicano que precisa voltar a seu país, Aspinia, e protegê-lo. Aspinia é uma nação jovem que foi fundada há apenas vinte anos separando-se do império. Generais e sábios juntamente com o povo uniram-se para fazê-lo.

Benetram, rei da República, sonha com um país sem os preconceitos das classes estratificadas do império e um lugar no qual reine a igualdade. Porém, como é de se esperar, graças a problemas como fraca economia, terras secas e generais apressados, ela começa a se destruir não apenas de fora com a tentativa de reconquista pelo imperador, mas também por dentro. Uma das pessoas que mais desejaram a república, Edmund, acaba achando que Aspinia tornou-se apenas um outro império.

Certamente tiveram em suas aulas de história do Ensino Fundamental e Médio alguma consideração a respeito de tentativas de fazer o mesmo como a famosa Revolução Francesa. O próprio “ideal republicano” é muito mais pautado nesse evento moderno do que em qualquer forma anterior de uso da palavra.

República vem do latim “res publica” e uma tradução bem literal seria “coisa pública”. A obra do filósofo antigo Cícero chamada “De re publica” nada mais é do que um tratado “Sobre as coisas públicas”. E público nada mais é do que aquilo que se refere à população de uma cidade, ou qualquer organização comunitária. Ou seja, “república” originalmente poderia ser entendido algo como “aquelas coisas que acontecem publicamente”.

É algo bastante próximo do conceito de “política” para os gregos que designava apenas qualquer organização social ou grupo como a própria pólis (cidade em grego).

E para onde isso tudo nos leva? Toda essa reflexão nos leva a considerar a verdadeira república que são os videogames. Afinal, os jogos são públicos: são fenômenos que possibilitam toda uma comunidade de jogadores em torno deles. Caso um jogo fosse unicamente privado e nunca compartilhado, jamais se tornaria em tradição. Ou seja, sequer poderíamos considerá-lo como um jogo. Com a linguagem acontece algo semelhante: se falamos algo que ninguém mais pode nos entender, é questionável se falamos de fato, já que esse ato exige alguém que nos ouça e nos compreenda.

Esse “compartilhamento de uma experiência comum” ocorreu-me enquanto jogava Shining Force III e ampliou meu entendimento acerca da república para além da definição moderna. Era nas praças e nos anfiteatros em que a república acontecia: não era um estado, mas apenas a constatação de que muitas coisas são comuns e devem ser compartilhadas: e isso vai além do aspecto financeiro.

Uma república, portanto, não é fundada apenas, mas é o resultado de um diálogo entre seres humanos que muitas vezes pensam diferente, mas que possuem um algo em comum a ser discutido. Fora que a própria civilização enquanto tal pode ser compreendida como jogo também segundo pensadores como Huizinga: não seria uma das razões essa “coisa em comum”, essa tal de “res publica”?

E, para finalizar, será que a tal “cultura gamer” que tantos pesquisadores defendem por aí não seria simplesmente um jeito pouco preciso de descrever essas comunidades de jogadores em torno de games em específico, ou espaços amplos de discussão como este que é a Academia Gamer?

É isso que queria compartilhar com vocês essa semana! Bom feriado e até o próximo post!

Academia Gamer: República

13 ideias sobre “Academia Gamer: República

  • 13/11/2012 em 12:12 pm
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    É muito interessante como, às vezes, aqui e em outros blogs que falam de games a gente encontra pessoas com opinião iguais ou parecidas com a sua – não sua especificamente, Senil, mas de cada indivíduo que visitam estes espaços.

    Mas você pontuou bem como essa “res pública” é, em suas – agora sim, é sua mesmo – palavras como de “um jeito pouco preciso”. É uma República informal, e acho bom que seja assim. Sabe por que? Porque a partir do momento em que começa-se a tomar muito partido de determinado jogo, ou empresa, ou console, as discussões ficam mais pobres e menos construtivas. É o que ficou conhecido como “ismos”, e os “istas”, convenhamos, são caras muito chatos.

    Por isso é bom discutir games com pessoas de mente mais aberta, é mais edificante. Pensando nisso, aí teríamos a República Gamer, realmente. Enquanto o pessoal “istas” criariam uma forma de “Império”, sendo que dessa forma as coisas não são tão públicas, já que uma opinião mais diferente seria censurada em um ambiente assim.

    Viva a República Gamer, então.

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  • 13/11/2012 em 7:55 pm
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    Ótimo texto, e de fato, bastante reflexivo.

    Há algum projeto de tradução para o inglês ou português dos outros jogos.
    Nunca me interessei jogar o três por causa dessa limitação, por não poder jogá-lo completo, mas agora bateu a vontade.

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  • 13/11/2012 em 8:11 pm
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    sorte sua estar jogando essa pérola do Saturn, Mestre. sobre esse assunto de república num game(geralmente games medievais de estratégias)é o mais próximo do jogador ter aula de história. pois parece que cada game do gênero, se tem politica, acordos, favores, traições e lutas para se atingir a liberdade, o a república.

    “Por isso é bom discutir games com pessoas de mente mais aberta, é mais edificante. Pensando nisso, aí teríamos a República Gamer, realmente. Enquanto o pessoal “istas” criariam uma forma de “Império”, sendo que dessa forma as coisas não são tão públicas, já que uma opinião mais diferente seria censurada em um ambiente assim.”

    pegando essa parte do Onyas, até que a geração Sony e Microsoft são razoaveís em discutir a qualidade e defeitos dos seus consoles e jogos. mas a geração Nintendo(a Wii para ser mais exato)…pelos uns sites que vi, basta a pessoa apontar um simples defeito de tal game, para ser xingado de palavras de baixo calão. nem todos são assim nos sites da Nintendo, mas a grande maioria…

    Hee-Hoo Mestre Senil

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  • 13/11/2012 em 9:49 pm
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    As séries de Phantasy Star e de Shining Force eram excelentes, até que a SEGA resolveu dar um tiro no pé ou se jogar da ponte, fazendo os Phantasy Stars On-line e os Shining Forces do tipo hack-and-slash… Puxa vida, a SEGA tinha os ingredientes perfeitos em mãos para continuar essas séries em altíssimo nível.

    Vocês poderiam recomendar um bom emulador de Saturn para rodar o Shining Force III?

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  • 14/11/2012 em 7:54 pm
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    O contexto politico desse jogo é muito bem trabalhado, imperio x republica, mas por de traz disso o imperio estava sendo influenciado por um culto religioso: Bulzome. parece muito com Star Wars se vocês pararem para perceber, os Vandals seriam como os Sith e os Inovators (os herois escolhidos pela Luz) como os Jedi, e claro, o imperio vs a republica; o Wallcurray seria uma versão da “Estrela da morte”… enfim, a unica coisa que me incomodou na estória era o fato da República ter um REI! pode isso Arnaldo?

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  • 18/11/2012 em 3:08 am
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    Olá pessoal! Adivinhem?… Correria de final de ano no trabalho… Mal parei durante o feriado… Só a gora tive um tempinho para responder… Espero que isso melhore um pouco quando Dezembro chegar… Não gosto de postergar nossas discussões assim…

    Fernando Lorenzon,

    Valeu cara!

    De fato a Sega tem muitos games que tratam disso (alguns de estratégia mesmo inclusive).

    Sobre essa temática política, eu a achei mais forte mesmo no Shining Force III. A série Force (só esses de estratégia da série Shining) costuma, claro, dar uma importância maior a essa questão. Até porque reunir um “exército” (se é que se pode chamar um punhado de doze pessoas de exército hehehe) geralmente é para lutar contra alguma outra nação ou coisa do tipo.

    No SFIII, isso é muito melhor trabalhado e a ênfase é grande sem ficar chato, manja? Até porque conforme vamos jogando os três games, começa a ficar claro que essa guerras políticas é que complicaram tudo no continente e que o que importa é lutar contra a verdadeira origem do mal.

    Mas é tudo bem planejado: as falas dos personagens republicanos e imperialistas descrevem bem seu modo de viver, dificuldades e bonanças de cada estilo de governo. Para ser sincero, só parei mesmo para pensar no que seria uma República jogando esse game pela primeira vez há uns oito anos atrás (mais ou menos) pela primeira vez.

    Só depois (uns dois anos atrás) que entendi o lado do Império quando finalmente joguei o segundo cenário. Outro game que me ajudou a entender melhor essas questões políticas e de império foi o Langrisser II (ou Der Langrisser na versão SNES e de PX-FX). Até falei dele com vocês quando discutimos sobre inimigos que aprendemos a respeitar.

    Sobre sua pergunta do final. Shining Force (a série toda) não é um jogo puro de estratégia por turnos (como Power Dolls, por exemplo), mas tem muitos elementos de RPG pelo meio do caminho. Alguns comparam com Fire Emblem por não existirem “unidades padrão”, mas personagens mesmo; só que como nunca joguei nada dessa série, não sei se procede. Eu o vejo como um “jogo de xadrez diferentão”. hehehe Ele é complexo e desafiador na medida certa podendo agradar tanto fãs de RPGs tradicionais como de estratégia. Eu mesmo comecei a me aventurar nesse tipo de jogo pelo Shining Force II.

    O Langrisser é mais um meio termo: você tem generais, mas também contrata mercenários que podem morrer sem problema. hehehe Ele requer muito mais reflexão na hora de decidir os movimentos e tudo mais.

    Onyas,

    Bom mesmo, né? hehehe É legal ler opiniões diferentes também, eu acho. Claro, isso se a pessoa se dispuser a conversar sobre o assunto mesmo que discordemos completamente sobre ele. hehe

    Que é exatamente o que você falou em seguida. Caímos diretamente naquela questão do diálogo que tratamos antes: se discutimos algo em comum (que comecei a ver como uma res publica), o foco é esse algo em comum. Não perdemos nossas individualidades por isso e nem nos atacamos pessoalmente se o foco é o discurso.

    Os “istas” talvez tenham o problema de tornar segregado algo que deveria ser disponível a qualquer pessoa. Um erro muito semelhante aos artistas contemporâneos que fazem “arte para artistas” e exigem que você seja um gênio para conseguir apreciar aquilo (ou que entre na “turma” de bajuladores dele etc.).

    Leon,

    Valeu cara!

    Gosto muito desse jogo também. É meu preferido da série Shining inclusive. Só joguei poucas vezes porque ele é muito longo (umas cem horas no mínimo e jogando com relativa pressa hehehe), então acabo repetindo mais facilmente outros games da série como o Shining the Holy Ark.

    Tem um personagem com seu nome no time do Julian inclusive. hehehehehe

    Unknownuser2,

    Vixe, desses aí eu não sei nada… Exceto que a Camelot (ou a “Sonic Software Planning”) não está envolvida e que, por isso, perdeu muito do charme da série desde o Shining Soul para GBA. Até tenho curiosidade, mas não sei se encararia não…

    Felagund,

    Valeu pela força!

    Tem projeto de tradução para o inglês e, pelo que parece, estão começando a criar versões para francês, espanhol e outros idiomas. Isso porque a inglesa está quase finalizada, então é mais fácil trabalhar assim creio eu.

    leandro(leon belmont) alves,

    É um grande jogo mesmo, viu? Vale cada minuto investido nele!

    Sobre sua reflexão em relação às empresas, eu acho que isso é até fácil de entender a razão. A Sony e a Microsoft preocupam-se mais com hardware e coisas assim. Até produzem um jogo ou outro, mas não sustentam um console com seus títulos. E a Nintendo é de uma época em que “empresa de videogame” significava também fazer jogos e como não têm mais a Sega como rival (que fazia o mesmo e, a meu ver, melhor porque visitava áreas que a Nintendo mal visita até hoje como arcades), os “nintendistas” tendem a defender a empresa com unhas e dentes contra tudo que aparece.

    Eu passo longe desse esquema. Sou grande fã da Sega, mas no máximo o nome da empresa em um game ou console auxilia na “sedução” dele para comigo. Se o game é ruim, eu digo sem problmas. hehehe E como aquele pessoal que sabe que o disco de uma banda é ruim, mas como gosta da banda diz que é bom. Gosto não tem nada a ver com juízo de qualidade afinal de contas.

    LordDan,

    No caso da série Shining, precisariam apenas restabelecer contato com a Camelot. A Sega detém o direito dos nomes e dos jogos já lançados, mas a Camelot é a empresa que fez os jogos clássicos de fato. Houve até uma petição para esse reencontro uns tempos atrás no aniversário da série ou algo assim.

    Já com Phantasy Star, é mais desleixo mesmo. hehehe Eu até gosto de PSO e PSU, mas prefiro a série clássica (em especial os três primeiros jogos). A impressão que tenho é que a Sega quis mesmo enterrar a série com PSIV e reviveram a franquia “sem querer” durante o desenvolvimento do Phantasy Star Online.

    Thiago Fabri,

    Interessantes essas suas comparações! Nunca tinha pensado nisso. hehehe

    O problema do Império nem era propriamente o envolvimento com Bulzome, mas o “uso” que fizeram dele (Domaric e Arrawnt) para conseguirem aquilo que queriam. Seja criar um novo país, ou reanexar a república à Destonia. Esse lance dos Vandals e Innovators é explicado melhor no Shining the Holy Ark, eu acho, mas é uma das partes da ambientação do game que mais gosto até hoje. Eles colocam alguns problemas teológicos bem interessantes.

    huahuahuahuahuaha Olha, eu acho que é possível uma república com um rei sim. A questão é que não fica claro se: (1) o Benetram é apenas uma figura temporária que será extinguida depois que a República se estabelecer solidamente; (2) se Benetram é rei apenas como “voto de minerva” em decisões com os lordes todos de Aspinia; (3) se ele é o “primeiro entre os iguais” (como os patriarcas das igrejas ortodoxas que são mais uma figura representativa, que não tomam decisões e apenas são consultados em caso de empates em concílos e coisas do tipo); ou (4), se como o jogo é japonês, para eles todo sistema de governo exige uma autoridade régia qualquer.

    Temos países até hoje que mesmo que se intitulem “impérios” e tenham monarquias, são bem mais republicanos que outros países sem essa figura. O Reino Unido é um exemplo, mas também a Espanha, alguns países nórdicos (não sei se todos) e o Japão.

    Se a monarquia de um país não é absolutista, não acho que seja um problema para uma república. Mas não sou cientista político e posso estar completamente enganado. hehehehe

    Marcio Yukio Lima,

    Demorei meses também na primeira vez que joguei tudo! E olha que nem fiz nada de opcional nessa vez, mas agora estou tentando fazer tudo o que posso. hehehe Hoje mesmo arrumei um tempinho para derrotar o Taros com o time do Julian. “Só” falta fazer o mesmo com o time do Medion e do Synbios. hehehe Isso vai levar um bom tempo agora já que estão bem mais fracos que Julian e cia.

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  • 20/11/2012 em 1:52 pm
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    Ótimo texto!

    Pertenço a época em que joguei essa maravilha no Sega Saturn no seu lançamento.Tive o CD americano original e os outros dois “scenários” japoneses alternativos.Coisa rara no Brasil e principalmente aqui no Ceará.

    Foi sem dúvida o rpg que mais me deu orgulho ao lado de Grandia. Mostrando que uma vez bem trabalhado,o console negro fazia maravilhas.

    Um detalhe do texto que devo dar minhas congratulações é sobre o enredo-histórico do jogo.Coisa que em nenhuma revista na época nos deu o luxo de explicar e sem o advento da internet,jogávamos usando nossa imaginação de como era a história sem termos a menor noção do real enredo.

    Um grande abraço.

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